sexta-feira, 27 de junho de 2008

Lavagem cerebral obrigatória

Há uma interessante matéria na Folha sobre um casal que luta na justiça pelo direito de educar o próprio filho. Enquanto nos EUA e outros países o movimento de "homeschooling" cresce, no Brasil é proibido tirar os filhos da escola. Os pais podem até perder a guarda do filho se continuarem nesse rumo.

Pareceria que o Estado é que é o "dono" da criança. De fato, uma das educadoras citadas na matéria argumenta o seguinte:

“Do ponto de vista estritamente individual dá para compreender a atitude dos pais. Mas tem o ponto de vista maior, que é preservar uma política pública. Não dá para deixar que cada um resolva a escolaridade do seu filho à sua maneira.

Não-dá-para-deixar. Entenderam? Quem manda é o Estado.

Ora, o que se aprende hoje em dia na escola além de doutrinação? Pouca coisa. A qualidade de ensino no Brasil é péssima, e muito mais se aprende com a família, ainda que de forma indireta. Eu aprendi muito mais lendo em casa, pois venho de uma família na qual sempre se leu e estudou muito. Quem dependia só da escola se ferrou.

O sempre ótimo Pedro Sette Câmera fala aqui sobre sua experiência escolar:

Chega a ser comovente perceber como as pessoas esquecem a sua experiência escolar. No dia em que eu soube que nunca precisaria ter contato com a química orgânica, senti um alívio como jamais experimentei novamente. Esqueçamos os objetivos nominais da escola. A principal experiência que ela proporciona é a sensação de um nonsense institucional: você tem que aprender coisas pelas quais não tem o menor interesse, ouvir as respostas de perguntas que não fez nem faria, ditas por alguém que quase sempre também demonstra que preferia estar na praia, e o objetivo supremo disso é passar num exame para um curso universitário que você não sabe se quer fazer. Depois as pessoas ficam ressentidas, achando que essa parte da vida delas é uma mentira, e… elas têm toda razão. É um desperdício de tempo e dinheiro. (...)

O mais comum é que você preserve os seus interesses intelectuais apesar da escola, não por causa dela. No meu caso particular, sei que devo muito a algumas professoras de literatura, mas são exceções tão fortes que suas aulas constituem as únicas memórias vívidas que ainda guardo de situações de ensino. De resto, só tenho lembranças de momentos passados com meus amigos. E é por causa deles, dos nossos pares, que recordamos o passado com algum carinho.

Eu não tive uma experiência escolar particularmente ruim, mas se penso em tudo o que estudei e que hoje não me serve mais tampouco acho que esta tenha contribuído tanto assim. E acho que uma família deve ter o direito de educar os próprios filhos em casa se assim o desejar. Garanto que no fim das contas estarão muito mais aptos a enfrentar o Vestibular e a vida do que muitos garotos que freqüentam a escola pública atual.

11 comentários:

Ricardo C. disse...

X, concordo com a crítica à qualidade do ensino, mas penso que a vida em sociedade exige contrapartidas de todos os lados, Estado e cidadãos. Nesse sentido, a idéia de um ensino que promova a aquisição de conhecimentos em diferentes áreas — de minha parte, não gostava de química e tive dificuldades em matemática quando saí de uma escola francesa e entrei numa brasileira, com métodos totalmente diferentes — me parece acertado.
Mudando de assunto, li um artigo do Marcelo Coelho sobre a "Crítica da teoria crítica" que talvez te interesse, até porque ele cita o Spengler. O texto está aqui

Mr X disse...

Hum, não tenho mais paciência para o Coelho, seja Paulo ou Marcelo...

E na verdade nunca li o Oswald Spengler, o que eu cito às vezes é um curioso colunista do Asia Times que usa esse pseudônimo.

Este é um blog a favor da liberdade, portanto acho que o homeschooling deveria ser uma opção... o Estado, seja qual for sua orientação ideológica, não é dono da mente das crianças. Nem das famílias. Mas é uma longa discussão, claro que há casos de famílias que tiram as crianças da escola para pô-las a trabalhar ou pedir esmola, etc.

Ricardo C. disse...

Pô, X, mas vc lê o Reinaldo e o Olavão, como assim não tem paciência pro Marcelo Coelho? Além do mais, ele comenta uma crítica que o RA teria feito a um texto seu, vale uma olhada, ora!
Abs

P.S. Você é um bom polemista, irrita e diverte. E certamente, bem melhor polemista do que eu.

Edu disse...

Cara, concordo que muitas vezes seria extremamente interessante poder ser auto-didata ou educado pelos pais porém enfrentaríamos dois problemas básicos:

1- Se meu pai resolve me botar na escola depois de X anos de ensino, como eu posso saber em que série que eu estou?! Pelo nível do ENEM dá pra imaginar que todo mundo entraria no terceiro colegial...

2 - O nível de escolaridade e nível de educação são indicadores de performance para governos reconhecidos internacionalmente. Além disso, fazem parte do IDH.

3 - Com o descomprometimento do governo sobre a educação do país, professores cada vez menos valorizados e preparados e material didático e salas de aula cada vez mais antigos e sucateados, imagina o nível de comprometimento do governo com o ensino depois de uma decisão dessas?!... e eu duvido que abaixaria um centavo sequer nos nossos impostos.

Resumindo, duvido que haja interesse de qualquer governante abdicar de um indicador tão importante para a sua gestão para atender algo que a classe média já realiza através de cursos particulares e escolas particulares. No final das contas, poderia até liberar o ensino em casa, porém a grade curricular teria que ser mantida... aí ferrou!

Espero contra-argumentação!

Abraço

Unknown disse...

Gostei muito deste post MrX. Comentei com uma irmã minha que é pedagoga e psicóloga e ela me pediu uma cópia para levar a um dos colégios onde ela trabalha.
Parabéns!
PS:
Eu sempre odiei aquela maldita tabela periódica...

Anônimo disse...

Ricardo, dê-nos um link sobre esta história...vi que o marcelo Coelho cita Chesterton adoidado.

Mr X disse...

Poxa,
Obrigado KCT! Mas na verdade grande parte do post é do texto do Pedro Sette Câmera mesmo, lá do blog O Indivíduo. Aliás recomendo ler todo o artigo. Eu só peguei carona... E linkei com a matéria do homeschooling.

Rodrigo,
É, li agora, parece que tem uma picuinha entre o Coelho e o Reinaldo, é?
Mas na verdade, nada contra o Marcelo Coelho, antes o lia na Folha, é só que hoje, sei lá, tanta coisa para ler, tão pouco tempo...

Um abraço

Mr X disse...

Opa! Ricardo, não Rodrigo, hehehe. :-)

Ricardo C. disse...

Chest, a réplica do Marcelo Coelho está aqui. De lá dá pra ir tanto ao texto do RA, quanto ao próprio do M. Coelho que incitou a crítica do RA.
Abraços

Anônimo disse...

a resposta dele de que estava dando uma chance a direita, bla, bla, bla, é coisa de viadinho que é pego com as calças na mão....

Anônimo disse...

Concordo com a opção de educação caseira. No entanto, seguindo algumas regras, como prestar provar a cada semestre ou bimestre para saber se a criança realmente tem aprendido. Não concordo em quase nada com o texto do sr. Câmara. É verdade que todos nós passamos por mãos de professores que estão ali sem a menor vontade e que ao menos poderiam explicar como aplicar ao cotidiano o aprendido em sala de aula. Muito melhor do que ficar debatendo "o importante não são as matérias, mas sim formar cidadãos"; no entanto, aprender todas aquelas matérias chatas, muitas esquecidas ao longo dos anos, ajuda a desenvolver o raciocínio, ajuda a pensar, e isso é válido. Hoje, acho uma grande besteira esse pessoal que corre atrás de mestrado ou doutorado apenas para ter o diploma na parede (vá a uma biblioteca de faculdade e constate que 90% das teses e dissertações são uma porcaria), mas não posso negar a partir do que vejo no trabalho e no dia-a-dia que existe uma notável diferença de conteúdo entre aqueles que têm estudo completo e aqueles que não têm. Obviamente existem exceções, para pior e melhor, bem entendido.