sexta-feira, 27 de setembro de 2019

Farewell

Tie the strings to my life, my Lord,
Then I am ready to go!
Just a look at the horses --
Rapid! That will do!
Put me in on the firmest side,
So I shall never fall;
For we must ride to the Judgment,
And it's partly down hill.
But never I mind the bridges,
And never I mind the sea;
Held fast in everlasting race
By my own choice and thee.
Good-by to the life I used to live,
And the world I used to know;
And kiss the hills for me, just once;
Now I am ready to go!

Emily Dickinson

sábado, 14 de setembro de 2019

Retorno do paganismo?

O paganismo está na moda?

Algumas pessoas, como a nossa leitora Fernanda Souza, apostam num retorno do paganismo como uma possível solução para a Europa, e filmes e livros se interessam pelo tema.

Assisti recentemente "Midsommar" e "The Wicker Man", dois filmes de terror (suspense seria mais exato, já que nenhum dos dois filmes é exatamente assustador) que tratam do tema do paganismo.

"Midsommar" é um filme deste ano dirigido por um judeu novayorquino que trata de um grupo de jovens americanos que vão passar uns dias na Suécia com uma comunidade pagã que revela-se ser um pouco mais do que exótica.

Parece que neo-paganistas e nacionalistas brancos odiaram o filme, mas só uma pessoa muito tola para achar que o que está representado ali tenha qualquer relação com rituais pagãos reais - sim, alguns aspectos foram supostamente inspiradas nos rituais ou na estética nórdica pagã, mas em geral fica bem claro que se trata mais do que tudo de fantasia. Além disso, mais do que terror, o filme é um drama ou alegoria sobre uma relação romântica que não está dando certo, de forma que o contexto do culto pagão é de certa forma apenas um detalhe circunstancial. O filme poderia igualmente ser ambientado em qualquer outro culto ou seita sem mudanças básicas. O filme não apresenta nenhuma discussão séria sobre o paganismo. Porém, em um interessante artigo recente, o Dr. E. Michael Jones observa a relação de "Midsommar" com a história do erotismo e do pornô no cinema, que começou a se tornar mainstream justamente na Suécia, com filmes como "I am curious, yellow" ou os filmes de arte de Bergman como "Monika e o desejo" (se não me engano famoso por conter um dos primeiros nus frontais no cinema). E de fato a sexualidade é o tema principal de "Midsommar".

"The Wicker Man", clássico de 1973, é, não sei se eu diria que mais "realista", mas parece ser mais baseado em costumes reais. Tampouco é exatamente um filme de horror, mas é interessante, e também se centra na sexualidade: a cena da loira nua dançando no quarto ao lado para provocar o protagonista é divertida. Mas, ao contrário de "Midsommar", que ignora totalmente o cristianismo (o grupo de jovens são basicamente progressistas pós-cristãos e não há qualquer menção religiosa, mas é curioso que o protagonista masculino se chama "Christian"), neste outro filme o conflito entre moralidade cristã e paganismo é mais explícito.

Muitos desses filmes e livros sobre o paganimso assumem que os pagãos tinham uma cultura sexual mais "liberada" do que a do casto cristianismo, com mulheres dançando nuas na floresta e muito sexo toda hora, bem como maior liberdade femenina.

Mas será mesmo verdade? Os romanos e gregos, ou ao menos os atenienses, eram estritamente patriarcais. Os nórdicos, não sei bem, mas em Germania do Tácito, se informa que as tribos germânicas tendiam à monogamia. É possível que existissem cultos de fertilidade e orgias, mas provavelmente limitadas a episódios similares ao Carnaval, ou então que representassem um período de decadência. Afinal, a maior liberação sexual em Roma ocorreu certamente durante seu período mais decadente.

Tem um livro, "Civilization and Sex", do britânico J. D. Unwin, que argumenta que liberação sexual e decadência estão fortemente ligadas, numa relação de causa e efeito. Ele estudou várias civilizações e descobriu que todas elas na sua decadência apresentaram liberação e desregramento sexual. Seu argumento é que o controle sexual por meio da monogamia e de uma moral rígida promove a ordem social e a transferência dos impulsos sexuais em atividades mais criativas e construtivas.

Não vejo o paganismo muito como solução, e muito menos o neo-paganismo moderno, que é politicamente correto e está ligado com todos esses movimentos "new age" que a esquerda já vinha promovendo desde os anos setenta pelo menos. Ultimamente até o satanismo virou progressista, com a Church of Satan declarando que é "contrária ao racismo" e criando estátuas multiraciais de louvor a Baphomet.

O neo-paganismo também virou multi-cultural, com muitas associações neo-pagãs americanas dedicando-se a combater o racismo. E o movimento wicca faz tempo que já é basicamente um instrumento de promoção do feminismo e do aborto.

Mas existem movimentos neo-pagãos ligados ao nacionalismo branco como a "Order of Nine Angles", que promovem uma visão mais radical, inclusive a favor dos sacrifícios humanos e de rituais de magia negra.

De qualquer modo, não vejo um retorno ao paganismo como solução para muita coisa. Posso até crer que este seja possível quando ocorrer um colapso social e um retorno ao primitivismo pré-civilizatório, mas não creio que leve a um período de muita estabilidade.

O problema da humanidade é que ela tende a esquecer o seu passado. Constrói-se um muro para se defender de dragões ou de hordas mongóis; logo as gerações se acostumam à tranquilidade proporcionada pelo muro e passam a questionar a sua existência. Finalmente o muro é derrubado. As pessoas então começam a ser atacadas por dragões ou hordas mongóis. E então as novas gerações começam a entender, "ah, é para isso que existia o muro..."

A mesma coisa com grande parte dos movimentos sociais das últimas décadas. Estamos (re-)descobrindo por que as proibições relativas a sexo, drogas e comportamento tinham lá a sua validade. Concluo com uma citação de Jung, referindo-se a Roma no período do surgimento do cristianismo, em contraposição ao período moderno:

"O significado desses novos cultos como Cristianismo e Mitracismo é claro; é uma restrição moral dos impulsos animais. A aparência dinâmica de ambas as religiões mostra algo desse enorme sentimento de redenção que animou os primeiros discípulos e que hoje mal sabemos apreciar, pois essas velhas verdades estão vazias para nós. Certamente ainda deveríamos entendê-lo, se nossos costumes tivessem só um fôlego da brutalidade antiga, pois dificilmente podemos perceber nos dias de hoje os turbilhões da libido desencadeada que rugia pela antiga Roma dos Césares. O homem civilizado dos dias atuais parece muito distante disso. Ele se tornou meramente neurótico. Assim, para nós, as necessidades que originaram o Cristianismo foram realmente perdidas, uma vez que não entendemos mais o significado delas. Não sabemos contra o que elas vinham nos proteger."

Acho que, cada vez mais, estamos descobrindo.