...Ou, quem sabe, objetivista?
Confesso algo que vai chocar alguns leitores: nunca li um livro completo da Ayn Rand. Tenho em mãos o "Atlas Shrugged" e pretendo tentar novamente a empreitada, ainda que o tamanho do volume seja algo intimidador (Estava entre ler a Ayn ou o "Ulysses" de Joyce. O "Ulysses" é menor).
Por outro lado, assisti no outro dia uma palestra de um certo Dr. Bernstein, filósofo objetivista. Foi muito interessante, mas não me convenci. Parece-me que os randianos, a partir de um suposto racionalismo, no fundo transformam o capitalismo em uma espécie de religião. Talvez seja uma solução: já que não é possível eliminar completamente a religião e a espiritualidade da vida humana, uma alternativa seria transformar o capitalismo em religião ou, vá lá, filosofia de vida.
Mas voltando à pergunta inicial: este blog é libertário ou conservador? Ou objetivista? Ou nenhuma das alternativas?
Tendo rejeitado os sonhos progressistas de mudança social através do Estado, o blog iniciou sob os auspícios de Milton Friedman e Isaiah Berlin, ou seja, na mais perfeita promoção do mais perfeito libertarianismo. Porém, ultimamente, tenho lido mais blogs ligados ao tradicionalismo conservador, um pouco por interesse antropológico, um pouco por desconfiar da utopia libertária quase tanto quanto da esquerdista. (Não gosto de utopias, sejam de esquerda ou de direita).
Acho que meu problema é que não creio totalmente no primado da razão e nos ideais do iluminismo; quer dizer, não tenho certeza que o homem seja um "animal racional" e, portanto, desconfio de todos aqueles que apelam ao racionalismo de forma tão exaltada, ou enxergam um "sistema" a partir do qual todos serão mais felizes. Embora não seja religioso praticante (escrevi um post falando sobre religião e fui chamado de carola e papa-hóstias - na verdade, a hóstia sempre foi a minha parte preferida da missa) - acho que acredito no ponto de vista da tradição judaico-cristã, de uma humanidade eternamente imperfeita.
Ou, na frase de Immanuel Kant, "com a madeira torta da humanidade não se pode construir nada de perfeitamente reto."
Talvez eu seja apenas... um pessimista?
sábado, 25 de abril de 2009
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22 comentários:
Bem, o libertarianismo é distante do mundo atual, mas não é realmente utópico porque não pretende reformar a natureza humana. Ele apenas se pretende o sistema mais moralmente justo, e filosoficamente me parece ser mesmo, só não sei se é viável.
(Inviável, em todo caso, também não é sinônimo de utópico: o Brasil é inviável, afinal).
Rand é a defesa mais russa imaginável do capitalismo, o que não é uma coisa boa. É um troço meio ideologia Tio Patinhas, ela vai logo chegando na canela, xingando de vagabundo. Rand é grosseirona mesmo, mas tem seus momentos. Isso de que, se você não resolver o ceticismo filosófico, se não ver a realidade como coisa objetiva, não poder respeitar os outros seres humanos, e a desmistificação da filantropia, me parecem o mais certo nela.
Tente Murray Rothbard, ele escreve bem melhor, e a véia não chenga nem perto de ser tão radical quanto ele é, anarquista pero sin perder la ternura.
E tem Theodore Dalrymple, que não a chega a ser ideólogo, mas é um conservador ateu. Vejo você mais nessa linha, conservador secular, o que não é igual a libertário.
Eu vejo a utopia no libertarianismo não no fato de querer reformar a natureza humana, mas no fato de ter como premissa uma determinada natureza humana. Por isso que muitas teorias libertárias falhariam no mundo real. Mas assim como os 'comunistas puros', os libertários morrerão lamentando que sua ideologia nunca foi aplicada 'pra valer' porque, aí sim, teríamos um mundo lindo, maravilhoso e justo.
Deixo um exemplo: á uma teoria libertária que diz que o trânsito sem regras flui melhor e de forma mais segura porque as pessoas serão mais cuidadosas (sacou a idealização das tais 'pessoas'?). E suportam essa teoria com experimentos feitos em cidades com duas dúzias de habitantes. Basta chegar um forasteiro para começarem os atropelamentos e batidas.
Resumindo, tanto para o comunismo quanto para o libertarianismo funcionarem, é necessário que o ser humano se encaixe no padrão definido como premissa. Até hoje, porém, o comunismo foi o único que tentou enfiar o cilindro no buraco quadrado.
Outro: veja a proposta libertária para a justiça e a segurança exclusivamente privadas. Diga-me se não são casos de pura ficção.
Rand é meio, nunca a finalidade. De qualquer modo, o mundo não é justo, e o maior mal é feito quando pessoas tentam aplicar a "justiça" cósmica na Terra.
Claudio, é a lei da selva.
Tem que ser ateu pra entender a Rand. Ela não defende o capitalismo, mas uma moral humana que consequentemente leva ao capitalismo. Ela vê o homem como o fim em si, enquanto que para os teístas e estadistas o homem é um meio. Um meio para uma divindade maior, ou para uma "causa maior". Enfim, quem acredita em Deus não "acredita" em Rand.
E se o homem não é racional, feche o seu blog. Afinal, são apenas latidos, certo? Pra que ler? Pra que escrever? Pra que viver?
O problema dos teístas é que eles olham muito para o céu e esquecem de se olhar no espelho.
Temos racional , irracional e não-racional. Nem todo conhecimento é racional.
Numa reunião de coordenadores de pós-graduação com um dirigente da Capes me ocorreu uma ideia provocativa, que já sei de antemão desagradará religiosos e crédulos em geral. Ele disse que, embora os cursos de pós-graduação tenham crescido bastante no país, inserindo-o no rol de países avançados, o setor de engenharias ainda é extremamente carente, isto é, temos poucos engenheiros, graduados ou pós-graduados. É um problema antigo e grave.
Então, vamos à minha elucubração "sextaferina". Se o país tivesse, digamos, quase tantos engenheiros quanto são os crentes em religiões (além dos crédulos em bobagens pseudocientíficas), seríamos a maior potência do planeta.
E por que não temos isto? Ora, porque as engenharias não invadem o bercinho das crianças como fazem as religiões. Se dedicássemos às crianças tantas horas de contato com a matemática e as ciências quanto dedicamos às religiões, o quadro seguramente seria outro.
Repare-se bem: não estou falando em tirar o tempo das crenças e crendices, nem dizendo que engenheiros ou cientistas são todos descrentes. Mas acho preferível ter um engenheiro crente do que crentes sem conhecimento científico algum.
Já vou botar a armadura...
Postado por Orlando Tambosi
chest- acho que o Tambosi anda "viajando".....
Peraí, Cláudio, mas todo sistema filosófico parte de alguma ideia a respeito da natureza humana. A maioria dos conservadores, por exemplo, acredita que somos ruins de nascença e precisamos ser contidos, educados.
Talvez esteja certo, mas é ainda assim uma premissa a respeito da natureza humana.
E nem todos os libertários são otimistas, vide H. L. Mencken ou a própria Ayn Rand. Acho que ninguém que prevê um mundo em que ainda existam cadeias está realmente sendo utópico - errado talvez, mas não imaginando uma ordem a qual todas as pessoas estejam perfeitamente adaptadas para todo o sempre, a cura para o mal.
Enfim, há vários graus de viajação entre libertários, Cláudio, nem todos são otimistas e a maioria nem é anarquista. A maioria, me parece, também tem uma visão meio rasa a respeito do ser humano, um lance meio Homo economicus. Mas estar errado não é ser estar do coladinho com comunista, como você anda colocando no seu blog.
Marton, não entendi a última frase.
Creio que não, Marton. Filosofia é entender a realidade. Ideólogos sim partem de esquemas pré-concebidos. Até concordo que um filósofo imagine um tipo de comportamento para estabelecer alguma teoria, mas ela tem que ser abandonada assim que refutada pela realidade, caso contrário ele deixa de ser filósofo para ser um ideólogo.
Libertário "soft" é liberal e com estes eu me alinho.
"A maioria, me parece, também tem uma visão meio rasa a respeito do ser humano, um lance meio Homo economicus."
Yeap!
Agradeço aos colegas pelo estimulante debate.
Realmente acho que me identifico mais com o Theodore Dalrymple. E um pouco com o Spengler, antes dele ter virado David P. Goldman.
"Liberal clássico" seria outra alternativa, ainda que a palavra "liberal" tenha sido distorcida, tanto à direita quanto à esquerda.
Uma favelo do Rio é um perfeito exemplo da aplicação das idéias libertárias. Lá não há havia estado. E uma das poucas regras da humanidade que pode confiar é: "não há vácuo de poder". Os traficantes assumiram o lugar do estado e da justiça nesses lugares, e quando alguns moradores tentaram lutar contra isso surgiram as milílicas, que nada mais são do que "polícias privadas".
Por isso eu acho que eu sou conservador. O estado, no meu ver, não concede direitos, apenas os protege.
Até aqui, execrável Chesterton?
A Rand é mais romancista que filófa ou economista. Fiquei espantado de vê-la citada - ainda que de passagem - no belo livro "Invariances: The Structure of the Objective World", cuja leitura recomendo vivamente.
Tambosi, explica para nós qual a relação, entre crer em Deus e estudar engenharia. Engenheiros são ateus? Cristãos não fazem curso de engenharia? Já sei, você quer 60 milhões de engenheiros no Brasil....
se vc não está gostando do Atlas sugiro the fountainhead (a nascente em português).
Vale a pena ler a Rand sim, ainda mais no presente momento onde as opiniões sobre a tal crise se dividem.
parabéns pelo blog!
Acho que meu problema é que não creio totalmente no primado da razão e nos ideais do iluminismo; quer dizer, não tenho certeza que o homem seja um "animal racional" e, portanto, desconfio de todos aqueles que apelam ao racionalismo de forma tão exaltada, ou enxergam um "sistema" a partir do qual todos serão mais felizes. Embora não seja religioso praticante (escrevi um post falando sobre religião e fui chamado de carola e papa-hóstias - na verdade, a hóstia sempre foi a minha parte preferida da missa) - acho que acredito no ponto de vista da tradição judaico-cristã, de uma humanidade eternamente imperfeita.
Ou, na frase de Immanuel Kant, "com a madeira torta da humanidade não se pode construir nada de perfeitamente reto."
Talvez eu seja apenas... um pessimista?
1. X acerta quando fala que o "randismo" se assemelha a uma religião.
2. X erra ao colocar na conta do libertarianismo caras como o Friedman e o Berlin. Ora, a Escola de Chicago, apesar de algumas claras intersecções, difere muito daquilo que disse Mises ou Bohm-Bawerk. Aliás, coisas como os vauchers da educação, defendidos pelo Friedman, horrorizam caras como o Rothbard. O Libertarianismo, ideológico que só, não admite viés pragmático. O erro quanto ao Berlin é ainda mais grave, basta comparar sua obra à de Hayek, esse sim um verdadeiro libertário. Extremado, mas brilhante e, por isso, um ideólogo de mão cheia. Mal comparando, o Isaiah estaria para a filosofia política como o Friedman estava para a ecoomia. O primeiro temperando o radicalismo de Mises. O segundo o de Hayek. Ambos injetando pragmatismo no horizonte utópico do libertarianismo. Apesar do Marton achar que não, a ideologia libertária é tão utópica quanto a socialista, só co o sentido inverso. No entanto, concordando com o Fábio, considero-a filosoficamente mais justa.
3.Para desconfiar de utopias não é necessário buscar o tradicionalismo conservador, principalmente aqueles de m,atriz religiosa. Caras como o Oakeshot e o John Gray criticam acidamente a esparrela que vem de ambos os espectros ideológicos, os dois provenientes de uma única matriz: o ilumnismo, o qual fazes bem em desconfiar. No entanto, o fazem sem apelar a qualquer visão religiosa.
4. Por falar em religião, X, o vitimismo é uma coisa bem infantil, sabia? Chamei-o de carola não por ter escrito um post sobre religião, mas por achar que NECESSARIAMENTE o apelo do Dawkins a esquecer deus e aproveitar a vida teria a ver com um chamado ao hedonismo mais irresponsável e inconsequente, o que é um disparate.
5. O Dalrymple é muito bom, mas acho que a filocarolice do X o distancia um pouco do Theodore. Acho que o X tem mais a ver com o Roger Scruton.
Kbção
P.s:"Eu vejo a utopia no libertarianismo não no fato de querer reformar a natureza humana, mas no fato de ter como premissa uma determinada natureza humana. Por isso que muitas teorias libertárias falhariam no mundo real. Mas assim como os 'comunistas puros', os libertários morrerão lamentando que sua ideologia nunca foi aplicada 'pra valer' porque, aí sim, teríamos um mundo lindo, maravilhoso e justo."
Bingo, Cláudio!
Só pra constar, a traduçao do emblema da bandeira mineira é "liberdade ainda que tarde", rs.
Abraço!
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