Yehuda Amichai (1934-2000) é o grande poeta de Jerusalém. Escreveu centenas de poemas sobre a cidade. Já publiquei um de seus poemas aqui, com tradução de Millôr Fernandes. Lamentavelmente, há poucas traduções e sua obra é quase desconhecida no Brasil. Trata-se, no entanto, de um dos maiores poetas do século XX, e não na minha estimativa, mas na de quem entende do assunto. É claro que jamais ganhou o prêmio Nobel.
Escolhi três poemas sobre Jerusalém e depois fiquei na dúvida sobre qual deles publicar; portanto, publico os três. Dois em tradução tosca minha do inglês ao português, o último em inglês mesmo. (Amichai, é claro, escrevia em hebraico. As versões abaixo são meras aproximações)
O amor por Jerusalém
Há uma rua onde vendem apenas carne vermelha
E há uma rua onde vendem apenas roupa e perfumes. E há
um dia no qual vejo apenas aleijados e cegos
E aqueles cobertos com lepra, e espásticos, e aqueles com os lábios torcidos
Aqui constróem uma casa e ali destróem
Aqui cavam para dentro da terra
E ali cavam para dentro do céu
Aqui sentam e ali caminham
Aqui amam e ali odeiam.
Mas aquele que ama Jerusalém
Segundo o guia turístico ou o livro de orações
É como aquele que ama uma mulher
Segundo um manual de posições sexuais.
* * *
Turistas, Parte 2
Uma vez eu estava sentado nos degraus próximos ao portão da Cidadela de Davi e larguei duas pesadas cestas de compras ao meu lado. Um grupo de turistas parou ali ao redor do guia, e eu me tornei seu ponto de referência. "Vocês vêem aquele homem lá com as cestas? Um pouco à direita de sua cabeça há um arco do período Romano. Um pouco à direita da sua cabeça." "Mas ele está se mexendo, ele está se mexendo!". Eu disse a mim mesmo: a Redenção virá apenas quando alguém lhes disser, "Vocês vêem aquele arco ali do período Romano? Não interessa, mas perto dele, um pouco à esquerda e abaixo, há um homem que acaba de comprar frutas e verduras para a sua família."
* * *
The U.N Headquarters in the High Commissioner's House in Jerusalem
The mediators, the peacemakers, the compromise-shapers, the comforters
live in the white house
and get their nourishment from far away,
through winding pipes, through dark veins, like a fetus.
And their secretaries are lipsticked and laughing,
and their sturdy chauffers wait below, like horses in a stable,
and the trees that shade them have their roots in no-man's land
and the illusions are children who went out to find cyclamen in the field
and do not come back.
And the thoughts pass overhead, restless, like reconnaissance planes,
and take photos and return and develop them
in dark sad rooms.
And I know that they have very heavy chandeliers
and the boy-I-was sits on them and swings
out and back, out and back, out till there's no coming back.
And later on, night will arrive to draw
rusty and bent conclusions from our old lives,
and over all the houses a melody will gather the scattered words
like a hand gathering crumbs upon a table
after the meal, while the talk continues
and the children are already asleep.
And hopes come to me like bold seafearers,
like the discoverers of continents coming to an island,
and stay for a day or two
and rest...
And then they set sail.
domingo, 9 de março de 2008
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4 comentários:
chose,
mazel tov !
acorda misterekis ! ))
ça va confetti?
shalom
zeno's coscienza....chose, vc nao para de me surpreender com suas analises....
vc é o spengler ? fala a verdade, estamos sozinhos ...))
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