Houve uma polêmica no Brasil com o filme "A Serbian Film" (*), que chegou a ser proibido pela Justiça mas agora, parece, foi liberado. Não foi só na Tupiniquilândia que o filme causou confusão. Também foi banido na Espanha e teve cenas cortadas no Reino Unido para poder ser exibido. Nos EUA, ele foi exibido sem cortes, mas só porque aqui ninguém dá muita bola para filmes estrangeiros.
Não vi o filme e, francamente, nem pretendo ver. Mas, sabendo que tem cenas que incluem uma decapitação durante o ato sexual, o estupro de um bebê recém-nascido e mais outras imagens de necrofilia e bestialismo demasiado doentias para mencionar até mesmo neste blog, pergunto-me se neste caso a censura não seria um ato de clemência com o espectador.
Sempre que alguma obra polêmica é censurada, muitos reclamam e saem em campanha defendendo a "liberdade de expressão". Mas peraí, qual liberdade de expressão? Hoje em dia é proibido falar qualquer coisa que seja contra o politicamente correto. Criticar os muçulmanos? Não pode. Atacar os gays? Dá cadeia. Falar em diferenças culturais ou raciais? Tabu. Os jornais americanos e europeus causam alarmismo sobre o "aquecimento global" mas quando há tumulto social falam em "jovens" causando confusão, raramente especificando que se tratem de muçulmanos ou outras minorias.
Ora, a única liberdade de expressão que restou é a de produzir obras de "arte" cada vez mais escatológicas. Mas será que, nesses casos, a censura na realidade não ajudaria a criar obras um pouco melhores? Os nossos artistas locais vivem criticando a ditadura militar de 64, mas, cá pra nós, será que sem a tal censura esses artistas seriam hoje tão famosos e teriam ganho tanto dinheiro? Ao menos nessa época escritores tinham que esforçar-se para ser mais sutis; compositores como Chico Buarque tinham que bolar boas letras para driblar a censura.
Os limites, na verdade, ajudam à criatividade. O escritor Jorge Luis Borges, em ensaio que agora não consigo encontrar, falava justamente sobre esse auxílio indireto que a censura pode dar às obras literárias demasiado óbvias. Penso por exemplo nos filmes da época de ouro de Hollywood, os quais, sem poder mostrar diretamente cenas eróticas, tinham no entanto uma encantadora sutileza de diálogos que hoje se perdeu.
Por outro lado, nada como a censura para transformar uma obra "polêmica" em sucesso de público. Lembrei de quando, lá pelos anos 90, proibiram "Je vous salue Marie" do Godard no Brasil. Nunca assisti, mas o filme chegou a ter sessões alternativas lotadas. Sei de pessoas que assistiram para "burlar a censura" -- e o consideraram o filme mais chato jamais realizado. (Bem, depois de tudo era um filme do Godard.)
Não vou ficar aqui defendendo a censura, afinal o problema com isso sempre é: quem é que deve definir o que deve ser censurado e o que não? Prefiro um mundo em que todos possam falar ou filmar o que quiserem, e que o leitor ou espectador decida em quem acreditar. Por outro lado, considerando o estado da arte contemporânea, às vezes me pergunto se a censura não faria um bem a certos "artistas", e à cultura contemporânea em geral. (Bem, só espero que esse filme sérvio não tenha sido financiado pelo governo ou pela Petrobras local, como costuma acontecer com os similares lixos nacionais, ver por exemplo "O Baixio das Bestas".)
(*) Obs.: Não entendi por que o título no Brasil não foi traduzido simplesmente para "Um filme sérvio", em vez de ter um titulo em inglês que nem é o original (o filme é sérvio, afinal), acrescido apenas de um ridículo subtítulo, "Terror sem limites". Mas é o mesmo país que traduziu "The Hangover" como "Se beber não case"... Ainda sobre o título, aqui um interessante texto (em inglês) fala sobre o caso. Por que essa escolha? O filme poderia ter sido chamado "Um filme pornô", "Um filme de horror", ou, vá lá, "Terror sem limites". Portanto, associar o nome do filme tão diretamente ao país tem claras intenções políticas (e segundo alguns críticos, o filme aparentemente também é uma elaborada metáfora política sobre... alguma coisa). Seja como for, o fato é que um filme tão violento não vai ajudar a limpar a imagem dos sérvios, injustamente demonizados durante a guerra dos Balcãs; mas talvez fosse exatamente essa a intenção.
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8 comentários:
Liberdade de expressão só para obras que não critiquem os intocáveis do momento: islamismo, gayzismo e a questão das diferenças raciais. Vc acha que um documentário defendendo a tese da inferioridade inteletual e moral dos negros em relação aos brancos, mesmo com farto embasamento científico e dados empíricos, seria liberado no Brasil? Vc acha que haveria grupos reivindicando a liberdade de expressão ou a não-censura para um documentário com tal conteúdo?
Para os nossos anti-censuristas, um filme que mostre cenas extremas de assassinato, pedofilia, necrofilia e outras aberrações são muito mais aceitáveis do que um documentário que simplesmente exibisse resultados de pesquisas científicas sobre a relação entre inteligência, comportamento e raça.
Pior ainda são os "numerosos" 30 imbecis tentando censurar - via CONAR - os Poneis Malditos!!!
vai quem quer ao cinema.
Salve.
Demonizar os sérvios parece ser não só políticamente correto como quiça altamente recomendado... acho que foi o Olavo de Carvalho quem mencionou um filme policial que girava em torna de investigação sobre uma quadrilha dedicada, entre outras miudezas como o tráfico de drogas e de "indocumentados", ao seqüestro de jovens mulheres e meninas de Kosovo que eram forçadas a prostituíção por toda a Europa, sob ameaça de morte até de seus parentes ainda residentes em sua terra natal.
O problema é real mas os mafiosos que dirigem o negócio tiveram sua identificação étnica cuidadosamente preservada na ficção, transformados que foram de albaneses em sérvios...
Aquela podreira d'O Albergue poderia se chamar Um Filme Eslovaco?
"Aquela podreira d'O Albergue poderia se chamar Um Filme Eslovaco?"
Pois é. Aliás, Hostel 2 foi um dos piores filmes que já vi na vida. Eu até gosto de filmes de horror, mesmo alguns filmes com cenas extremas. O filme "Audition" (link no post abaixo) não é ruim, embora tenha cenas fortes. Mesmo assim, não tenho vontade de ver "A Serbian Film".
Agora, tem a questão que os autores do filme sérvio são sérvios. Adivinho que os cineastas sérvios devem ser como os brasileiros, sempre malhando o país (e sempre pelos motivos errados) e mostrando as imagens mais horrorosas e violentas possíveis, porque isso faz mais sucesso nos festivais internacionais. Mas não sei.
Salve.
E-êh... imagina se o nosso cinema malha o país assim gratuítamente, e nem me refiro aos subsídios oficiais e mamamtas correlatas, ele também sempre respondeu a "claras intenções políticas" e na obra de qualquer pornógrafo-chique do estilo do Jabor os iniciados viam (também) elaboradas metáforas políticas.
Bom, vai se saber o que passa pela cabeça de um sérvio... fora as balas da OTAN ou de algum al-quaeda albanês... provávelmente a nostalgia dos "bons tempos" da velha Iugoslávia do Tito, em que seu país tinha alguma importância estratégica e seu povo alguma razão de que se orgulhar de si.
Antes que a "primavera dos povos balcânicos" os reduzissem à isso: Figurantes de filmes que envergonhariam o Zé do Caixão.
Baixei o filme assim que surgiu a polêmica, mas ainda não parei para assistir.
Bem lembrado o ataque aos Pôneis, citado pelo Mais-Valia.
É o cúmulo...
No mais, sou contra todo e qualquer tipo de censura. Adultos cuidam de si e as crianças têm (deviam ter) um pai e uma mãe para decidir o que podem assistir.
hmm... será que acabei de ser homofóbico?
Alguem sabe dizer se o filme "The stoning of Soraya M." foi exibido no Brasil? E' um filme que retrata a violencia dos apedrejamentos de mulheres no Ira. Da pra ver no youtube, de qualquer forma.
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