Mais do que tudo, o vídeo, ainda que bem realizado, parece um grande infomercial do Facebook. Seu objetivo declarado é o de manter soldados americanos em Uganda para que treinem as tropas do país para que estas possam prender Joseph Kony, líder da LRA, de forma que ele possa ser julgado pela Corte Internacional de Haia. Mas o que devem fazer as pessoas comuns como eu e você para ajudar nesse objetivo? Comprar um bracelete e posters para "tornar Kony famoso" e doar dinheiro para uma instituição de caridade. Se o objetivo de era arrecadar fundos, conseguiram: foram mais de 15 milhões de dólares em duas semanas.
Curiosamente, Jason Russel, narrador e criador do vídeo, teve um chilique poucos dias depois da publicação do vídeo. Foi filmado andando completamente nu pelas ruas de San Diego, em estado de profunda alteração mental, masturbando-se, vandalizando carros e gritando frases desconexas. Extremamente bizarro. Drogas? Vudu africano? Envenenamento a mando da CIA?
O vídeo original e tudo que se seguiu a ele parece ser um bom resumo do esquerdismo pós-moderno. Tudo é aparência, tudo é imagem. Você compra um bracelete e coloca um link no Facebook, indicando que está apoiando uma causa boa e ganhando status entre seus pares. A ONG ganha dinheiro, as mídias interativas ganham publicidade, os americanos se envolvem em mais uma "guerra humanitária", a ONU finge ter relevância, o globalismo vai avante, e enquanto isso a vida das criancinhas africanas, com ou sem Kony, continua igual ou pior. Depois o esquerdista metrossexual criador do vídeo gasta parte do dinheiro em bebida e drogas, pira de vez e termina internado, e todos esquecem o assunto, passando a apoiar a nova causa da moda, como o drama das baleias palestinas ou o impacto do aquecimento global no Inferno.
Bem, mas talvez eu esteja sendo demasiado duro com o Jason. Também muitos esquerdistas criticaram o seu vídeo, que segundo eles reduzia uma situação complexa a slogans fáceis. (Na verdade, esse é um aspecto positivo do seu vídeo, como campanha de marketing foi genial). Outros criticaram o fato dele declarar-se cristão evangélico e aceitar dinheiro de instituições religiosas (ser cristão é o pior crime hoje em dia). Outros ainda o acusaram de ser um homossexual enrustido pela sua aparência e trejeitos, mas acho que é apenas o modo de ser do homem ocidental pós-moderno. Enfim, não deve mesmo ter sido uma semana fácil.
No fundo, Jason parece ser uma boa pessoa, convicta de seus ideais. Talvez seja aí que mora o problema. No poema White man's burden, hoje acusado de racista, Kipling demandava que o homem branco ajudasse os povos menos desenvolvidos (O poema era dedicado aos americanos que naquele então ocupavam as Filipinas). O colonialismo como atividade humanitária. Pensando bem, era uma idéia melhor do a que de hoje em dia, onde o homem branco, em vez de colonizar outros países, decide ajudar os mais subdesenvolvidos fazendo com que migrem em massa para seu próprio país, em uma utópica e equivocada noção de igualdade total entre todos os povos, raças, etnias, religiões e culturas.
Alguns argumentarão, não sem certa razão, que o colonialismo não era tão humanitário assim, que era apenas uma desculpa para a exploração econômica, que houve muitos abusos, opressão, tortura e morte. Os franceses na Argélia e os belgas no Congo, para dar dois exemplos apenas. Tudo bem. Ainda acho que isso não justifica trazer para morar em Paris milhões de habitantes das ex-colônias em nome de uma equivocada reciprocidade. Melhor ter franceses na Argélia querendo transformar o país na França, do que argelinos na França querendo transformar o país na Argélia.
Do jeito que as coisas vão, qualquer dia é capaz do próprio Kony pedir asilo político como refugiado nos EUA ou na Europa, e conseguir. Desde que não more no mesmo bairro rico e branco de Jason, tudo bem!
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