quinta-feira, 30 de outubro de 2014

Frozen e as heroínas feministas da Disney

Chega de PT, chega de Dilma. Vamos falar sobre coisas importantes, vamos falar sobre "Frozen, uma aventura congelante". Assisti o filme ontem e gostaria de comentar um pouco. (Quem não viu, saiba que irei contar o final.)

O filme vai na linha das princesas feministas da Disney, algo no qual a empresa tem se especializado nos últimos vinte anos, desde Mulan, Pocahontas, etc. Na realidade, só consigo lembrar de "O Rei Leão" como filme com um bom protagonista masculino, mas confesso que não tenho assistido tanto os filmes da Disney (prefiro o Miyazaki, que, aliás, também prefere heroínas, ainda que raramente princesas, e em geral com uma complexidade bem maior - assistam A Viagem de Chihiro, por exemplo). Bem, mas "Frozen" arrecadou não sei quantos bilhões de dólares, portanto parece que a estratégia deu certo. A roteirista e co-diretora, por sinal, é uma mulher.

Digo princesas "feministas", pois a linha nos últimos tempos tem sido de personagens femininas rebeldes, fortes e independentes que não precisam de homem nenhum. Já em "Brave", da Pixar, isso podia ser notado, embora o filme seja muito bom e até tradicionalista sob certos aspectos. "Frozen", que tampouco é mau filme, embora a meu ver bem mais fraco que "Brave", vai um pouco além no feminismo. Já veremos como.

"Frozen" é supostamente inspirado no conto "A Rainha da Neve", de Hans Christian Andersen, mas a similaridade é praticamente zero, seria como dizer que "Batman" foi inspirado em "Drácula" por ter morcegos. Sério, leiam o conto original. É sobre um menino que é sequestrado pela Rainha da Neve (a qual, apesar de dar o título, pouco aparece na história), e sobre a menina é "quase uma irmã" que faz uma perigosa viagem indo até a Lapônia para salvá-lo. Parece que existe uma versão soviética de 1957 que é fiel a essa história, mas eu não assisti.

Em "Frozen" a Rainha da Neve não é a vilã, mas uma princesa, Elsa, que, por motivos não explicados, tem o superpoder de criar gelo e neve com suas mãos. Por acidente, ela acaba acertando a sua irmã Anna, que é a real protagonista do filme. O incidente faz com que Elsa cresça com medo de seus poderes e isolada de sua irmã Anna. Os pais de Elsa e Anna morrem de repente para sair do caminho, Elsa cresce vira rainha e Anna se apaixona no dia da coroação da irmã por um príncipe encantado. Tudo isso nos primeiros trinta minutos.  

A grande virada do filme é que o príncipe encantado, Hans, é o vilão da história. Ou melhor, ele é parece bonzinho e sincero até quase o final do filme, quando de repente transforma-se num cínico manipulador de corações, interessado em Anna apenas para poder obter o trono, e logo vira um maníaco homicida ao tentar matar Elsa.

A virada é pouco convincente, já que não existe antes nenhum tipo de indicação de que ele seria do mal, e mesmo seus motivos e suas ações, caso ele fosse mau desde o começo, não fazem muito sentido no contexto do filme, pois se fosse mesmo um vilão poderia ter resolvido tudo muito antes.

Na realidade, se formos pensar, ele até demonstra ser um líder mais convincente do que as duas irmãs histéricas: uma abandona o reino para sair construindo castelos de gelo e deixando o povo à míngua, a outra também larga o reino nas mãos de um desconhecido e sai correndo sem qualquer tipo de agasalho ou proteção à procura da irmã em plena floresta invernal, só conseguindo chegar a algum lugar ao ser ajudada pelo segundo personagem masculino da história, o caipira Kristoff. Mesmo assim, os dois fracassam na tentativa de recuperar Elsa, enquanto Hans, mais eficiente, consegue fazê-lo.

O outro problema do vilão é que ele nem é quem faz as maiores vilanias no filme: de certa forma, a grande vilã, ainda que por acidente, é Elsa, que é afinal quem congela o coração da irmã e coloca seu próprio reino sob um inverno eterno, depois abandonando a população. Hans, ao contrário, até aparece distribuindo cobertores aos pobres, algo que a Rainha jamais sequer pensou em fazer. Na realidade, a presença de Hans é até dispensável, não fosse pela necessidade dos roteiristas de querer ridicularizar o mito do "príncipe encantado que beija e salva a princesa no final". 

A moral do filme parece ser, as aparências enganam, não case com o primeiro que aparece, ou, talvez, mais especificamente: não case com um aristocrata, mas sim com um camponês musculoso de bom coração, afinal não é que ela tenha muito maiores informações sobre Kristoff. (O qual, aliás, é também meio abobado e também fracassa em salvar a sua amada e sequer chega a enfrentar o vilão, é uma irmã que salva a outra, mais um ponto feminista.)

Enfim, no fim das contas o filme não é também o bicho-papão misândrico a favor de lesbianismo e bestialismo que alguns disseram, é apenas um filme normal da Disney, meio bocó.  

Acredito que o filme seja mais interessante para meninas do que para meninos, já que é basicamente  um filme sobre duas irmãs emocionalmente complicadas, uma que não consegue controlar seus poderes, e outra que não consegue controlar seus desejos, e hesita entre dos homens. Porém, os temas de redenção, de passagem da infância à idade adulta, da luta do bem contra o mal, e a alegoria cristã presentes no conto original não estão ali. 



6 comentários:

Fábio disse...

X, desde a Branca de Neve a Disney faz histórias com heroínas fortes e homens em papel muito secundário - até porque são as mães que vão escolher os presentes para suas filhas, e mulheres compram muito mais do que nós (comprovado cientificamente).

Não acho que a Disney queira uma revolução feminista, eles querem é a continuidade do consumismo desenfreado que sustenta o capitalismo - tipo, não é Simone de Beauvoir que eles querem, e sim Becky Bloom, aquela que torra cartão a rodo.

Ou isso, ou os acordes de "Let it Go" seriam a nova Internacional Comunista ... rs ...

Fábio disse...

X, desde a Branca de Neve a Disney faz histórias com heroínas fortes e homens em papel muito secundário - até porque são as mães que vão escolher os presentes para suas filhas, e mulheres compram muito mais do que nós (comprovado cientificamente).

Não acho que a Disney queira uma revolução feminista, eles querem é a continuidade do consumismo desenfreado que sustenta o capitalismo - tipo, não é Simone de Beauvoir que eles querem, e sim Becky Bloom, aquela que torra cartão a rodo.

Ou isso, ou os acordes de "Let it Go" seriam a nova Internacional Comunista ... rs ...

Mr X disse...

Olá Fábio,

Sim, isso é verdade, o público feminino é mais consumista, e mais influenciado pela propaganda, e o de jovens adolescentes mais ainda, e o que eles querem é vendar.
Disney não é a maior empresa de entretenimento do mundo por burrice ou descuido.

Mr X disse...

Vender, não vendar.
Mas enfim, talvez vendar os olhos para a realidade, rs.

Brancaleone disse...

gostaria da colaboração de voces - especialmente a sua MR X.
Minha filhota teve uma ideia e vai apresentar no Ficiências.
Assistam o vídeo e se acharem uma boa idéia curtam e deem um like (odeio estas gírias!!) E se não for pedir demais, repassem a seus contatos...
Obrigado!
Assistam aqui:

http://youtu.be/X92N226yu8g

Anônimo disse...

Boa análise.
No fim das contas, Frozen foi apenas a Disney repetindo de forma inepta as 'lições' de Shrek com mais de uma década de atraso, e ainda sendo louvada por isso.