quarta-feira, 18 de fevereiro de 2015

Advogado do Diabo

Eu vou dizer agora o oposto do que disse antes, já que prefiro ser esta metamorfose ambulante. Ou melhor, não é que pense isto realmente, mas estou tentando dar uma de advogado do Diabo e ver o futuro com outros olhos. De olhos bem fechados.

Fiquei pensando, e se o mundo global for, mais do que uma distopia da qual devemos fugir a qualquer custo, apenas o curso natural dos eventos, resultantes do crescimento tecnológico,  das mudanças sociais e demográficas, e do caráter imperial global?

Nesse caso, o negócio não seria tanto fugir para a Antárctica ou tratar de reconstruir um passado mítico nacionalista-tradicionalista, mas descobrir como melhor se adaptar ao fluxo dos tempos. Sobreviver na escuridão.

Pense da seguinte forma: o Ocidente é um Império. O mundo global de um governo único não é o futuro, é já uma realidade. Como todos os impérios, o Ocidente invade outros países, mas também recebe em seu seio estrangeiros que vêm em busca de fortuna, ou então trazidos como escravos. Roma foi igual. Os impérios ibéricos também. E Hitler não queria a mesma coisa, dominando os eslavos e expandindo-se para o leste? O império Ocidental é apenas maior. E mais ambicioso.

Império. Quem disse que é uma estratégia de todo falha? Pense em Roma. Pense no Islã. Pense em Hollywood. Nos anos 70, 80, o cinema europeu ainda tinha certa relevância. Criaram um cinema de arte, e até comercial, que nada tinha a dever ao cinema da era dourada americana.

Hoje, Hollywood venceu. Tem praticamente um monopólio da produção audiovisual mundial, com exceção parcial do cinema asiático, que tem cotas e uma certa diferença cultural, mas mesmo assim o cinema de Hollywood arrebenta até na China. Isso aconteceu porque o mundo se globalizou.

O mundo globalizado, ao contrário do que parece, não é um mundo todo igual, não é um mundo onde todos se desenvoldem da mesma maneira. Isso é balela. O mundo global basicamente é um mundo onde algumas poucas cidades (New York, Londres, Berlim, San Francisco, Los Angeles, Shangai etc.) centram toda a produção, seja cultural, industrial ou digital, e o resto do mundo apenas consome, como porcos na manjedoura. Isso será cada vez mais extremo. Algumas cidades morrerão (como Detroit) para que outras possam renascer.

O preço a se pagar pelo lucro de alguns é a imigração continuada, que tem dois propósitos: a) aumentar o número de trabalhadores mais facilmente explorável e reduzir o custo da mão de obra, e b) aumentar o número de consumidores de mídia e quinquilharias.

De acordo com recentes estatísticas, haverá 11 bilhões de seres humanos no planeta em 2100. Destes, 4.5 bilhões serão asiáticos (incluindo aí Índia, etc) e 4 bilhões serão africanos. A África é o único continente que cresce hoje em termos populacionais. O resto do mundo praticamente parou. Nesse mundo de 11 bilhões, apenas 1 bilhão será de brancos. Os africanos serão trazidos para Europa, EUA e Oceania. Isto também é uma repetição do passado, quando os escravos foram trazidos para a América, do norte e do sul.

Bem, isso é o que dizem. Porém, na verdade, não temos porque ser tão pessimistas demograficamente. É pouco provável que chegue-se a esse número de 4 bilhões de africanos, e há vários sinais que tanto a fertilidade quanto a imigração apresentarão mudanças significativas para os europeus. 

A tecnologia também terá seu lado bom e ruim. Uma empresa sueca recentemente passou a abandonar os crachãs magnéticos em troca de micro-chips subcutâneos para seus empregados. Minha teoria é que a popularização de tatuagens e piercing nada mais é do que uma tentativa da mídia para nos acostumar às manipulações corporais cada vez maiores. No futuro, todos seremos meio cyborgs. A tecnologia invadirá nossos corpos e nossas mentes. O vício nos smartphones é apenas o começo. No futuro, como advertia o Unabomber, já não poderemos diferenciar o homem da máquina.

A manipulação genética também se tornará mainstream. Teremos uma classe alta eugenista, pois no começo isso será apenas para quem pode pagar. Mas o preço tenderá a cair, e logo a classe média também terá acesso. Muitas maravilhas e horrores daí surgirão.

O mundo do futuro não será nem Elysium nem Mad Max nem Blade Runner, mas tampouco será o de Ela ou 2001. 

Como dizia Oscar Wilde, não se deve profetizar, especialmente sobre o futuro. Porém, uma coisa e apenas uma coisa é certa: tudo será bem diferente do que pensamos.

Será que o Diabo teria razão?